terça-feira, 27 de julho de 2010

Tema: Janela

Com licença, Carlos. (Mas eu não confiaria em anjos se fosse você)


A doce calçada que se estende e beira toda a rua,
que percorre toda a cidade,
que se transforma em cidade enquanto houver rua em seu entorno.

Cidade que se entorna dos prédios e cascateia pessoas tristes.
Prédios de fratura exposta, de veias à mostra derramando gente,
Engolindo gente, recebendo luz.
Luz que escapa do olhar. É três por cinco, grita o centro da cidade.
Gritam os olhares distantes e desavisados. Com pressa. E rápido demais, as janelas olham.

Existe um vendedor de mapas lá embaixo.
Em meio ao centro, ao tremor e aos computadores.
Existe um homem vendendo mapa nas ruas.
Existe um mapa na janela fechada do meu computador.
Existem pessoas. E desencontros. E desencontrados.

Existem cores – Graças a deus existem cores ainda- ora, vejam.
Cores constantes. Algum poeta se infiltrou no departamento de trânsito.
Alguém coloriu as ruas constantes com sinais.

Existe o tempo.
Algum apressado pregou um relógio no prédio.
Alguém ritmou as ruas com instantes.


Existe um sino –
preguiçoso como um relógio aposentado, ele ainda existe.
O rádio toca ave-maria. Olha, Carlos, era um anjo também às seis horas.

E por falar em você, Carlos, daqui não vejo pernas. Daqui só as cabeças andam rápido demais. As cabeças de seis horas – sempre olhando pra cima, sempre olhando pra baixo.

E por falar em seis horas, Carlos, a tarde talvez fosse mesmo azul.
Azulejada, pra não esquecer de onde viemos. Pra não esquecer que o sino toca às seis.

E éramos sim, uma cidadezinha qualquer.
Qualquer cidadezinha planejada.
Qualquer calçamento mal-feito.
Qualquer pobreza e bem-feito.
Qualquer vida besta, meu deus do céu.

Mas tudo foi rápido. E rápido demais. Rápido demais as janelas olham – se é que olham - diariamente.
Quer dizer, as janelas mal olham – estão perto dos céus sem precisarem ser vitrais de igrejas. E o que de interessante pode haver lá embaixo? Ou ao lado?

Como os olhos e alma, as construções e janelas: a luz entra e sai rápido demais.
Nos falamos por antenas – que levam as coisas ao espaço pra depois trazer pra rua ao lado. É tudo tão alto, tão vertiginoso, tão sem asas nas costas...

Que são seis horas, aqui e no prédio ao lado e o sino já vai bater.
Eu não pulei ainda.

2 comentários:

  1. Numa nice!

    Se é que vc entende meu linguajar.

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  2. "Algum poeta se infiltrou no departamento de trânsito. / Alguém coloriu as ruas constantes com sinais."
    "Nos falamos por antenas – que levam as coisas ao espaço pra depois trazer pra rua ao lado."
    Puta, Tchul, você é do caralho. Umas coisas são suas, e eu não consigo sacar. Mas o que eu saco me dá vontade de sair correndo e te abraçar. Você abre umas janelas que vou te contar...
    !!! Lindo.

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