quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Tema da semana: Discos Voadores

Tema: Massinha

Já faziam quatro semanas que eu não conversava com ninguém e naquele momento aquilo parecia algo muito bom. Poucas roupas e pertences e quase tudo molhado e sujo, naquela bagunça pós-tempestade e eu só conseguia me lembrar dos meus discos e de como devia ser naufragar no espaço como o Major Tom da musica do David Bowie.
Nunca tive muita coisa, mas sempre o que tive foi precioso. Agora pra mim eu organizava num canto as minhas coisas e numa marmita de metal eu guardava coisas pra memória: um pacote inteiro de massinha de modelar que eu usava pra fazer bonequinhos - todos verdes, a unica cor que eu tinha - das pessoas importantes pra mim: a Yoko, minha cachorrinha, meus pais, meu irmão, Gabriel Garcia Marquez e mais uma meia dúzia de pessoas que ainda estavam comigo sempre.
Das nove semanas que eu passei naquela praia estranha e deserta, a ultima foi a que eu mais pensei. Armazenei umas frutas debaixo da árvore, um pouco de água, assentei e pensei. Pensei muito. Pensei em como deve ser viver na pele de um cachorro, sobre como boa parte da vida é desnecessária, como as coisas não fazem muito sentido e que a gente só fica em paz quando aceita isso, e como Tom Jobim errou na letra de "Wave": é plenamente possível ser feliz sozinho.Pessoas de massinha são seres humanos perfeitos ainda que tortos e mal feitos, inclusive, porque os de verdade são assim também.
Pensei tanto que esqueci de pensar em o que que seria da minha vida: foram os primeiros dias que eu não pensei nisso, e justo quando eu aceitei a condição de náufrago e já funcionava como um eremita perfeito, veio uma tempestade denovo e eu fui engolido sorrateiramente pelo mar e acordei na enfermaria de um clube à beira mar de uma praia de Santa Catarina.
Desde então, quando dá eu viajo pro litoral e perambulo de praia em praia atrás das minhas pessoas de massinha e da saudade que eu tenho de mim.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Tema: Massinha

(...)

13 de outubro

A vida é mesmo uma filha ingrata e mimada.
Um travesti me disse certa vez que a vida é uma doença sexualmente transmissível, crônica e mortal. Não o acho sábio, nem sequer engraçado ou original por essa frase. Mas essas palavras vivem se divertindo na minha cabeça, como uma piada sem graça que ficamos tentados a contar quando nos deparamos com pessoas sem graça. É incrível a quantidade de pessoas sem graça no mundo. Droga, essa piada me persegue.

Nesse meu ofício sujo, poucas vezes existe o luxo de certos sentimentos. Mas, dessa vez...
Pobre homem. Apesar do costume com cadáveres, vez ou outra, sinto alguma empatia por um. É o caso, estou comovido.
Ele morreu sorrindo. Tentou fazer um acordo, mas foi enganado. Pobre homem. Não se faz acordos assim em dias como os atuais. Não com esse bando de loucos à solta. Ele sorriu aliviado antes de ter sua barrigada completamente perfurada. Quanta confiança...

Como não podia deixar de ser, a noite é quente e eu me sinto um pouco exposto nessa camisa de mangas. Acho que são essas moscas. Malditas, a carne mal esfriou e elas já estão em cima.
Tenho de levar o corpo agora - a Agência exige. Mas tenho pena. Sei de sua história, investiguei tudo. Bom homem. Bom marido. O melhor empregado da editora. Bem relacionado. Muitos amigos. Estava sempre sorrindo. Passava confiança. Tinha postura, ajudava os amigos, a mãe e a esposa. Jamais incomodava a ninguém.

Esse é o problema das pessoas boas. Elas, normalmente, não ocupam espaço. Tornam-se moleiras, pedaços manipuláveis e de solidez pouco confiável. Cabem no molde da perfeição. Cabem em qualquer molde.

E se deformam.
Pobre homem. O mais doloroso é que todos morrem – mas, no caso das pessoas boas, parece injustiça. Não, a morte é a coisa mais justa do mundo – é o único ponto que iguala todos os homens.
-Pra morrer, basta estar vivo.
Eu só acelerei o processo. E matei um homem bom, igualando-o a todos esses vermes que enterrei durante esses anos.
Sinto enjôo. Deve ser fome. Esse cadáver vale o mês. Essa é minha vida – uma filha ingrata e mimada.
A piada não me sai da cabeça.

Tema: Massinha

Minha Massinha

Que saudade da minha massinha. Saudade de gastar meus dias ao seu lado, do cheiro do seu cabelo, do seu sorriso. Me lembro bem de acordar e olhar seu rostinho dormindo tranquilamente, do denso filete transparente de saliva que escorria de sua boca direto em meu colchão. Saudade da sua carne molenga, e de quando eu apertava os braços e as enormes coxas e falava baixinho no seu ouvido "minha massinha, minha massinha". Eu podia passar todos os meus dias só apertando minha massinha. Gostava da sua risada suína e da bagunça que fazia ao se empanturrar. Do gracioso chacoalhar de suas partes mais fartas. De repente ela começou a emagrecer, foi bem aos poucos, eu quase não notava. Quando ela começou a praticar esportes eu não dei muita atenção, falava que ia ficar magra, que ia ficar gostosa, eu achava que ela não tinha energia pra isso. Que em uma semana depois ela estaria sentada no sofá vendo novela e comendo pipoca com manteiga. Ah que saudade de vê-la lambendo aqueles dedinhos graúdos ensebados de manteiga. Eu até tentei cozinhar pra ela, mas não adiantou, ela foi emagrecendo e emagrecendo, começou a tomar banho todos os dias, passar cotonete nas orelhas, foi no dentista e de repente até um emprego ela arrumou. E não tardou a ser promovida. Andava muito feliz aqueles dias, achava que nunca tinha sido tão bonita. Apesar de tudo ela ainda me amava muito, sempre arrumava um tempinho para me agradar, o problema é que quando eu apertava aqueles braços duros e aquela barriga reta, eu não sentia nada, não sentia o calor. Seu hálito era de hortelã, e isso era insuportável, quando me abraçava eu sentia o perfume de condicionador e sabonete, me sentia enojado, sua face coberta por uma grossa camada de artifícios, seu cabelo bem penteado e seu salto alto. Minha massinha já não era mais humana, era agora uma boneca. Uma boneca grande e risonha, e não aquele riso agudo e estonteante de antes, até isso ela dizia ter endireitado. Tive de larga-la, não aguentava mais viver com ela, o término foi rápido e seco, não dei explicações, aquela não merecia explicações, nem sentimentos, ela não era mais minha massinha. Que saudade da minha massinha.

domingo, 22 de agosto de 2010

Tema: Massinha

Ouça

Não dê ouvidos àquele menino,
Franzino,
Que te emprestou o livro de Fernando
Sabino.
Temática pitoresca!
Coisa Besta!

Não dê ouvidos ao teu amigo,
Que te deu abrigo,
Falou contigo,
Sobre as coisas boas da vida.
Sobre o quão etéreo é o magistério,
E como um buraco tem fim.

Não dê ouvidos ao seu professor,
Arrebatador,
Que formou a sua mente.
Que te transformou em um excludente.
Que te fez um jornalista que peita presidente.
Faz sentido?

Não dê ouvidos ao sistema,
Àquele que só te traz problema.
Que te causa edemas.
Que faz do seu dia um piscar de olhos sem sorrisos.
Sem amigos.
Internaliza em você uma noção porca de prazer.

Não dê ouvidos à tua mãe,
Àquela que te gerou,
E te insultou, quando necessário.
E te chamou de otário.
Você é só uma extensão de um não que ela recebeu.
Você é o motivo de gorjeta.

Não dê ouvidos aos teus sonhos.
Londres não passa de uma fantasia.
Vá além da pedagogia.
Aprenda com a poesia,
Escute a vigésima quinta hora do teu dia.
E te engrace com o potencial da utopia.

Não dê ouvidos ao amor.
Ele só te envergonha diante dos mais machistas.
É uma pedra no seu rim.
É um fiasco do deleite e da sensação,
Uma podridão.
Salgada ilusão.

Não dê ouvidos aos teus ouvidos.
Eles são apenas uma pequena partícula de um recorte auditivo do todo que constitui o universo.
Uma vaidade intrínseca,
Que te faz delirar.
No silencio do jantar,
Ou no calar das ondas do mar.

Não dê ouvidos aos maus pensamentos.
Eles são passageiros,
E se perdem no tempo.
Adulam uma parte da população que não admite incremento.
Um tormento.
Vire à direita e siga o momento.

Não dê ouvidos à massa.
Ela tem o poder de transformar a sua mente em massinha,
De te reduzir a insignificância.
De tirar de uma criança a poesia da infância.
De não dar a um homem uma sombra de esperança.
De fazer um velho pigarrear até a morte chegar.

E, sobretudo, não dê ouvidos ao Pedro.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Tema da semana: Massinha

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Tema: Lady Gaga

Romance Ruim
(À Fausto Silva, Mao Tse-Tung e Andy Warhol)

Essa história toda começou num daqueles dias improváveis, sabe? Pensa num dia improvável, sei lá... uma terça-feira. Acho que foi isso mesmo e só me faltava assobiar a música que tocava no rádio – música grudenta, um apelo meio minimalista usado pra fins comerciais, me lembrava um pouco as músicas da década passada nos clubs.
E bem no esquema historinha, eu assobiava, quando dois homens me seguraram pelo antebraço, quase me carregando. Contestei, claro, sem muito escândalo com medo de ser um assalto. Eles me ordenaram silêncio, falaram para eu confiar neles.
É um tanto quanto ridículo isso. A última coisa que eu faria se eu fosse um conspirador maluco que quer recrutar pessoas em segredo e inopinadamente, seria falar para elas algo como um “confie em mim”. Confiar é o caralho. Ora, vamos ao mundo real, não? Se dois homens te seguram pelo braço, muito claramente intencionando alguma coação qualquer; qual é! Eu confio no diabo que não é humano, mas em vocês não, camaradas... vocês não.
-Entra no carro.
-Pra onde? O que tá acontecen...
-Confie em nós.
Bem dita a era da informática que reestruturou a comunicação escrita. Nos e-mails, bate-papos em geral, existem aqueles tais emoticons. E eles atendem muito perfeitamente a algumas situações como essa. Na hora que a figura me veio de novo com essa de “confiar” enquanto eu entrava no carro, eu reagi com um olhar que só um emoticon consegue exprimir graficamente. É algo como um: ¬¬
Meus braços doíam no carro apertado. Imagino que você, leitor, tenha uma cena de dois brutamontes vestidos de preto e óculos escuros me rodeando. O espírito é esse mesmo. Mas não eram assim, eram seres humanos muito normais - um deles não me era nem estranho, e ambos poderiam andar na rua sem a menor suspeita. Não eram fortes, talvez até mais franzinos que eu. Mas eram dois, e por maior que eu fosse, é como diz o ditado...
-Boa tarde, sr .:
- Como diabos você sabe meu nome? – me desesperei com a certeza de um seqüestro relâmpago.
Mas descobri que não era. O rapaz que eu, de alguma forma, identifiquei como um distante conhecido era um sujeito que me puxou de conversa no ponto de ônibus numa outra terça-feira, porque eu estava lendo um simples e maldito livro de poesias. E ele “que livro é esse?” e eu “Manuel Bandeira, conhece?” “sim... é... hum...você escreve?” eu “sim, já até tentei publicar uns livros de artigos acadêmicos” “olha, eu sou professor de literatura, escrevo também”... Lembro que fora uma conversa legal, produtiva, que até me fizera perder um ônibus. No final, nos apresentamos, deixei meu cartão e a partir daí, pelo que soube no carro, eu fui muito bem rastreado usando aquelas informações. Até aquele momento infeliz.
- A idéia é a seguinte sr.:, nós somos um grupo. Um grupo de escritores, como você. Na verdade nós somos todos os escritores do mundo...
-Nós? O motorista também?
- O motorista também.
-ah... e só?
- Faça-me o favor, sim? – ele usou aquele mesmo rosto do emoticon – Sr.:, nós somos um grupo enorme que se organizou em prol de um bem maior: a inteligência humana desperdiçada na falta de valor às obras primas. Os excessos da internet, o mau uso e desuso das obras que são de nosso direito, o capitalismo editorial, a pirataria – tudo aquilo que desvaloriza a nossa arte...
-Espera aí, como se já não bastasse toda a crise que está acontecendo, vocês ainda estão botando lenha na fogueira e dificultando as coisas com discussão e ...não é discussão?!?... você está querendo me dizer o que? Foram vocês?!?!
Caros leitores, eu bem gostaria de supor o conhecimento prévio de vocês acerca de a que crise eu me refiro. Porém, tendo em vista a excessiva atualidade da coisa, temo que, aos olhos da historiografia, da sociologia, ou melhor, da memória social, o fato citado, se perca algum dia por motivo de força maior. Portanto, esclareço.
Em idos da transição das primeiras décadas do século, houve um momento de crise no setor editorial – não falo da questão da pirataria ou dos direitos autorais, mas algo mais palpável, quase terrorista – empresas relacionadas a esse mercado faliram, devido a ações criminosas como vandalismos, hackeamento, roubos – tudo isso em instituições como as que fabricavam materiais como tinta para cartuchos de impressoras, ou as próprias gráficas, algumas livrarias, lojas de informática... Por conta disso, houve problemas em publicações, a mídia periódica entrou em crise de recursos e, por algumas semanas não houve nenhuma impressão de livro, e mais: sumiram-se as novidades. Ninguém publicava mais nada.
E tudo se explicava ali, naquele momento da descoberta em que atravessávamos a grossa porta de um galpão para uma escada enorme que dava num subsolo, no qual fora construída uma sala de proporções que, se eu fosse descrever, precisaria comparar e aí pareceria mentira. Era verdade: todos os escritores do mundo estavam ali; muitos foram seqüestrados, outros coagidos, mas muitos simplesmente integravam aquela organização diabólica.
- Pedro, por favor, com licença – nós passávamos por um grupo de quatro rapazes e uma moça logo na entrada – crianças, esse é o Sr.:... agora, Matheus, contacte o pessoal. Podemos começar a assembléia essa noite: o ultimo escritor chegou.
Essa assembléia (e eu não sei por que decidiram esse nome, já que estava mais para um comunicado sobre um determinado plano de ação) tinha como pauta uma das últimas e principais ações do grupo.
Pois bem, além do ataque a editoração e os boicotes a literatura vendável, o grupo resolveu reagir através de alguns ataques àquelas formas de expressão que eram consideradas inimigas das Belas Letras.
-... e então, na última semana, boicotamos também a industria cinematográfica. Claro que foi muito mais difícil e obtivemos muito menos êxito. Mas a proposta, a princípio é o susto. O que queremos é destroçar toda a mitologia que essa praga de século nos impôs. Nesse exato momento, em Nova Jersey, bombeiros estão limpando a cinza de mais de 3.907.000.000 exemplares de diversas revistas em quadrinhos queimadas numa ação conjunta. A indústria fonográfica, por si só, já está em crise, portanto não nos ocupamos com ela exatamente: mas com a iconologia que ela criou. Queremos acabar com essa mitificação da imagem de pessoas que se passam por artistas, através da música.
Essa mesma última frase fora repetida posteriormente por um escritor famoso no momento da introdução da assembléia. Antes, quando o rapaz do ponto de ônibus ainda me explicava as ações do grupo, eu perguntei sobre como eles se organizaram.
- Bem, a gênese dessa iniciativa é um mistério – mas através de cartas, parece que a maioria ficou sabendo. Alguns ignoraram, outros foram descobertos, como você. O processo foi longo. Juntamo-nos e os problemas estruturais foram resolvidos com o “tempo”- ele fez o gesto para essas aspas, seguido daquele roçar de dedos que simboliza dinheiro - afinal, a mulher mais rica do mundo é aquela escritora infanto-juvenil, certo?
- Não é a Oprah? – perguntei.
-Não!- me respondeu meio bravo um daqueles rapazes, cujo nome era, ou Túlio ou Luiz...
Pois bem, adiantemos para assembléia, aonde todo mundo (do mundo todo), com um fone de ouvido para tradução, escutava aquela frase repetida a que eu me referi.
- Queremos acabar com essa mitificação da imagem de pessoas que se passam por artistas, através da musica. – era o tal escritor famoso cujo nome não cito, por ordem ética – A música só é exemplo, pois, atualmente, ela se envolve nesse hibridismo entre essas artes visuais; hibridismo que tem empobrecido, e muito, a cultura de massa, mastigando as coisas e as entregando vomitadas. Após anos tentando nos enfiar nesse meio, mudá-lo, tomar parte, ter cadeira cativa no que hoje se chama de cultura (mas que não passa de uma imposição hegemônica, devo ressaltar); percebemos que a literatura perdeu vez. O que nos resta é uma atitude extrema: atacaremos uma dessas imagens, para chamarmos a atenção para nós.
(ovações)
- Por muito tempo procuramos ícones dessa “cultura pop” – ele também fez aquelas aspas irritantes com os dedos - e inclusive, recentemente, perdemos um daqueles que era o nosso melhor bode expiatório, justamente por termos exagerado na dose...
A moça que estava do meu lado, menina, pra ressaltar sua aparência jovem, chamava-se, pra não me enganar muito, Catarina, ou algo assim bem brando. Perguntei-a se ele estava falando de quem eu estava pensando.
- Aquele cantor? É... – eu cochichava – o tal do Mich... – fiz gestos que questionavam se também tinha a ver com o que ocorrera ao tal homem.
Ela, mais atenta ao discurso, só acenou com a cabeça o sim.
“Monstros”, pensei.
-E agora, temos a nossa intenção. Chantagear a cultura, com aquilo que está em seu auge, com um sacrifício mais saudável. Seqüestraremos aquela que representa um excesso de cultura pop, um excesso de tudo aquilo que nos abomina. A chamada Lady Gaga!
Fiquei um tanto perplexo. Palmas muito enérgicas, mas ainda assim, educadas, encheram o local. Percebi que percebiam meu assombro.
“Em Tróia, como os troianos”, pensei e comecei a bater palmas.

(continua...)

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Tema: Lady Gaga

Eu fico puto! disse ele puxando a cadeira, e ela na frente com cara de que não tinha muito ânimo de ir sempre naquele bar do outro lado da rua da faculdade já arqueava as sobrancelhas, com cara de "não importa o que você disser".
"A vida é assim meu bem, além do que ela funciona muito bem pra o que ela se propõe... é tipo um Marylin Manson tocando musica pra adolescente: com aqueles "metal" de começo de carreira ele nunca ia alcançar o mundo de gente que ele, pop, alcança..."
Já no terceiro copo ele fazia cara de entendido pra dar mais valor ao argumento, mas já percebia que pelo arquear das sobrancelhas da garota em sua frente - de copo cheio, o primeiro, já quente - não era só aquela discussão que não chegaria a lugar nenhum: "Mas é um clássico! Alladin Sane é um clássico! Ela não tinha direito sabe?"
"Você tá falando dessa coisa de clássico e não sei mais o que já tem horas!"
"Mas é um classico! E dos fodas!"
"Que seja! Cansa, sabia? Além do que, quando o Seu Jorge fez a trilha do "Life Aquatic", com aquelas versões bizarrícimas, você achou o máximo!"
"Pô, mas era Wes Anderson! Mereceu orabolas!"
"Seu problema é que você é cultzinho demais pra conviver com as coisas sabia!?! Inclusive, quer saber? Eu vou embora daqui porque eu já sinto muito que você é cultizinho demais pra conviver comigo! Vou indo antes que eu canse e vá pra não voltar!"
"Pois vá! E se quiser não volte!"
"O que? Perai! Tá me zuando né?"
"Não, eu também já tô de saco cheio..."
"Deixa eu ver se eu entendi... você tá falando sério sobre isso mesmo? E a discussão começou porque eu disse que achava legal a porcaria de um raio pintado na cara da Lady Gaga? Na boa!"
"O raio é do David Bowie."

Tema: Lady Gaga

Bad Romance

Já havia alguns meses que ele não se envolvia com nenhuma mulher e durante uma estressante rotina de trabalho seu corpo sentiu falta do calor feminino. Inexperiente na prática da "caça" Rubens se viu perdido. Pensou em recorrer a garotas de programa, mas sempre imaginava essas mulheres como seres cobertos de doenças venéreas, o que o fez mudar de ideia.

(telefone) Alô. - Sabe é que eu to precisando de mulher cara. - Quem é? - Sou eu o Rubens. - Ah Rubens! Quanto tempo cara. Mas, comé que é, mulher? - É se sabe, pega mulher, baile, essas coisas. - hahaha grande Rubens, baile, essas coisas, deu pra pega mulher agora? - Pois é, é que eu ando meio estressado. - Não, não, explica não, beleza cara, hoje a noite mesmo te levo numa baladinha.

Rubens está em pé ao lado da pista de dança e perto do bar. Parado sem saber o que fazer, ele observa as pessoas e o lugar. Ouve a música. Tudo é muito estranho, as pessoas aparentam estar mais felizes do que nos lugares em que frequenta. Sempre que anda na rua se pergunta porque as pessoas parecem tão tristes no seu dia a dia. Agora ele parece entender onde a felicidade foi parar.

(semi-berros) E aí se não ta curtindo? - To, to sim. - Ah, mais sua cara não diz o mesmo. - Como é que é? - Sua cara. Parece que se não ta gostando! - Ah! Então, só to achando um pouco estranho, mas, ta legal, é ta legal sim. - VamoRubão, vai tomando umas, se vai ver, daqui a pouco se ta soltinho la na pista pegando várias gatinhas!

Ainda em pé ao lado da pista de dança, Rubens agora bebe. A partir do seu terceiro drink ele começou a se sentir diferente. Seus pés começaram a se mover no ritmo da música, seus ombros ficaram soltos, e sua feição se tornou amigável. Não se sente mais tão deslocado, ele faz parte do lugar, é um jovem solteiro que quer se divertir. Repete isso para si várias vezes. A música eletrônica estranha lhe é mais agradável. Ele observa de longe seu amigo dançar e conversar com algumas mulheres. Quando eles se encaram, Rubens dá um sinal de jóia com a mão e abre um largo sorriso. Seu amigo lhe acena de volta e ele fica feliz.

(berros) Olha quem resolveu dançar! - É, eu gostei dessa música! - O quê? - Eu gostei dessa música! - Ah, é a lady gaga! - O quê? - É a lady gaga! A mulherada fica louca! - O quê? Lady Gaga, louca? - É cara, ta tudo loca, chega junto! - Eu não sei que que eu faço!

Na pista de dança com um problema já resolvido Rubens tenta resolver o outro. Enquanto movimenta seu corpo como as outras pessoas, a noite toma dois ritmos, o da música, e o de sorrir e dar goles em sua bebida alternadamente. Observando as tentativas de seu amigo de se aproximar de alguém do sexo oposto, ele ainda não sabe o que fazer. As luzes do lugar e o álcool estão o deixando eufórico e confuso. Quando novamente começa a tocar uma música da artista discutida anteriormente, as pessoas se mostram ainda mais felizes e Rubens toma isso como um sinal.

(berros) O que que eu faço? - Chega junto cara! - Como? - Sei lá! Dá seu jeito, sai da minha cola! - O quê? - Chega beijando, sei lá! - Eu gosto demais de você, você é um grande amigo! - Para com isso, vai pega uma gata! E para de beber!

Rubens caminha e dança, está desnorteado. Cada vez que olha uma mulher nos olhos sente um enorme frio na barriga e desvia seu caminho. O medo de não saber o que falar lhe faz retroceder cada tentativa. Respira fundo e escolhe alguém. Segura um par de braços e atrai o corpo junto ao seu, sua resposta ao nervosismo é beijar, sem dizer uma palavra. O beijo lhe dá uma sensação estranha de prazer e repulsa ao mesmo tempo. Vira as costas e vai embora, anda um pouco e seu amigo, ele tem no rosto um olhar engraçado.

(berros) Cara, aquele cara! - O quê? Que cara? - Aquele cara! - O quê? A mulher que eu tava beijando? - É! Aquele cara!

domingo, 8 de agosto de 2010

Tema: Lady Gaga

Lady Gaga

Dona Íris: To to que que... rendo co co con tar u u u ma ma história pa ra ra vô vô cês, ma ma ta tá difícil. Eu na na nas ci aqui me me mes mo, em Cujubim... Ah Alfre fre do conta pra eles!

Alfredo: Esta é a história de Dona Íris.

Íris, uma doninha que apesar da fala embolada era muito cuidadosa. Tinha uma eterna atenção com suas plantas, suas crianças e a ardósia que cobria o chão da sala. Todos os dias ela acordava, antes do sol; colocava, sempre, o pé direito, e logo em seguida o esquerdo, no par de pantufas que tem o costume de ficar ao lado da cama. Levantava-se, ia até o banheiro, lavava o rosto com sabonete de erva doce, voltava para o quarto e dava um grito, "Jô Jô". Jonas saia da cama, ligeiro, ia até a cozinha para preparar os ovos fritos, sentava-se à mesa e ficava de olho na porta esperando qualquer movimento para, no momento certo, estar com um sorriso firme no rosto.

A vida em Cujubim era assim. Normalmente, todos os maridos ficavam atentos às portas para que não fossem surpreendidos pela chegada inesperada de suas esposas. Nesta cidade, tudo tinha que estar em mais perfeita harmonia, não haviam erros. E se houvessem, todos deveriam fechar seus olhos.

O dia não ia muito além dos ovos fritos e do sorriso teatral no rosto de “Jô Jô”. Depois do lindo café da manhã que o casal vivia toda manhã, era hora de Dona Íris ir até a varanda da casa. A varanda era um cômodo sereno, tranqüilo, onde Dona Íris ficava até o almoço, bordando para os filhos dos seus filhos. A família já tinha atingido aquela proporção em que crianças correm de um lado para o outro da casa. Algumas delas eram até um pouco suspeitas, negrinhas. “Todos eram brancos, quase europeus, porque diabos nasceram crioulos?” De tempos em tempos esse pensamento vinha à cabeça branca de Dona Íris.

“O almoço ta na mesa!” Jonas, que cozinhava muito bem, gritava.

E todos vinham, depressa, experimentar o banquete do patriarca. Cada um tinha o seu lugar na mesa, ninguém ficava de fora e ninguém agia com falta de respeito. Era uma educação quase que francesa, apesar da distância entre a França e Cujubim. Todos tinham modos, e sabiam muito bem como utilizar os talheres. O almoço não se prolongava por muito tempo, de pouco em pouco as licenças eram ditas, e a mesa ia se esvaziando.

À tarde era a vez de Jonas aproveitar a varanda. Pegava o seu jornal e começava pela política. Quando o sol começava a atingir os seus olhos ele já estava no final do caderno de cultura lendo a charge do dia. E ao fim do jornal, como uma extensão de entretenimento, duas mulatas de bom porte desciam a rua, isso era tão diário quanto
a produção do periódico.

Então Jonas encontrava Íris na sala de estar e dizia que estava indo à venda comprar os ovos do dia seguinte.

Íris, não se contentava com o barulho do programa que passava na TV. Aquele era o momento do dia em que ela gostava do silêncio, tinha que estar atenta para a chegada do homem. Como a sua relação com a noite não era tão confortável, ela sempre ia para a cama cedo, e era lá que afloravam seus momentos de angústia a espera de Jonas. Mas ela não permitia que nenhuma asneira tomasse conta de sua mente.

O barulho da porta rangendo.

Jonas finalmente chegava, ia caminhando devagar até o quarto, e quando percebia Íris de olhos abertos, forjava um sorriso firme.

As últimas palavras de Íris eram:

“Bô bô bô bô bô bô bô bô boa noite.”

E Jonas fechava seus olhos.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Tema da semana: Lady Gaga

Tema: Janela

Da Janela

Ontem eu acordei, liguei a televisão, tomei o café da manhã e sentei no sofá. De vez em quando eu comia alguma coisa, dava uma espiada na janela, depois voltava pro sofá. De noite eu fui pra cama. Hoje eu acordei, liguei a televisão, tomei o café da manhã e sentei no sofá, aí eu fiquei pensando. Fiquei pensando na vida, nas coisa da vida, e aí eu fiquei cansado. Tirei um cochilo e acordei com uma dor de cabeça, aí eu pensei, esses pensamento tão me doendo a cabeça. Aí eu fiquei pensando nisso e minha cabeça doeu mais ainda. Se os pensamento me dói a cabeça eu tenho que tira eles dela. Agora eu to aqui, botando pensamento em papel. A tevê ta ligada ali no meio da sala, ta me esperando assisti ela, que besteira tevê não espera. Ninguém ta me esperando. A vida é assim, a gente se mata de trabalha pra consegui as coisa, aí a gente fica cansado, depois fica velho e fica mais cansado ainda, e a gente fica cansado de fica cansado e fica descansando, e depois a gente fica cansado de descansa. Quando eu comprei esse apartamento, achei a coisa mais bonita do mundo. Um apartamento no centro da cidade, eu achava que o centro da cidade era o centro do mundo, aí quando eu acordava antes de ir trabalhar eu ficava tomando meu café espiando a janela. O mundo ia começando acordar e e eu também, depois eu seguia rumo na vida. Agora que eu to velho e cansado o mundo já nem liga mais pra mim. Ninguém liga pra mim. Eu olho na janela, e ninguém me vê, na janela do centro do mundo ninguém me vê. To cansado de ninguém me vê, eu dei minha vida pro mundo. Meu dinheiro, meu tempo, meu trabalho, agora eu to velho e o mundo não quer saber de mim. Deve tá esperando eu morrer pra vender meu apartamento pra alguém, meu apartamento no centro do mundo, com janela, uma janela grande, grande e invisível. Janela grande, é janela grande, eu tenho essa janela aí. Pronto, vo joga alguma coisa dela e vê se o mundo lembra de mim. Joguei. Joguei um prato e foi bom. Eu joguei, ele parecia que caía devagar, fez meio que um zig zague bem devagarzinho e caiu, espatifou todo, aí as pessoas olharam pra cima, ficaram olhando eu rindo, devem tê até assustado, o velho ta vivo, é eles devem tê pensado. Aí eu fiquei rindo deles, uns olharam um pouco, depois continuaram andando rápido, pensando nas coisa deles. Fiquei invisível de novo. Na hora que eles olharam eu fiquei tão forte, o mundo me olhou no olho, aí subiu um calor na minha cara, nas bochecha e eu só fiz ri, foi bom. Agora to invisível de novo, invisível e cansado. Joguei um banquinho de madeira, dessa vez acertou uma mulher, uma mulher gorda comendo pastel, ficando mais gorda ainda, agora o pastel e ela tão no chão. Tem umas pessoa em volta, eles ficaram meio assustado, tão conversando uns com os outro, e eu olhando rindo, alguém gritou ô velho maluco. Velho maluco, velho maluco é o mundo, tem mais de dois mil anos, eu nem cheguei nos oitenta ainda, e esse velho maluco esqueceu de mim, só pensa nas coisa dele. Agora ele tá lembrando de mim, tem que lembra de mim, dei tudo que tinha pra ele, minha vida inteira. Eu é que não fico mais vendo a tevê dele. Olhei na janela de novo e eles tão lá ainda, a mulher ta sentada na calçada e tem um pessoal acudindo, acho que tem um policial também, eles tão tudo conversando, deve tá tramando contra mim, uns tão olhando pra cá, mais daqui a pouco eu fico invisível de novo e tenho que volta pra minha tevê, a única que espera por mim. Que bobagem televisão não espera ninguém, nem a ingrata da televisão ta esperando por mim. Pronto joguei logo a tevê de uma vez. Agora eu joguei uma coisa maior pra demora mais pra fica invisível e depois nem tem pra onde eu volta. É bonito, vê essas coisa caindo daqui de cima, cai devagarzinho, parece que dançando no ar, aí de repente espatifalha tudo e o mundo lá em baixo vai só estranhando. Dessa vez caiu no meio da rua, mais axo que uns pedaço acerto o pessoal que ta parado lá, eles gritaram uns negócio, dessa vez gritei também, gritei pra eles que eu já falei que o mundo que é um velho maluco e que não adianta eles fica tramando que um dia eles vai vê também. Vixe, olhei agora poco e tinha uns homem de marrom entrando no prédio e axo que eles tão batendo na porta, eu to tremendo e rindo, to tão vivo, o sangue ta correndo quente de novo, o mundo lembra de mim, quebraramaporta eu to vivisiohvnas v